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5/21/2011

DO TOMBO DA ORDEM DE CRISTO - parte I

Autoria: CETARQUIVO
Do Tombo dos Bens, Rendas, Direitos e
Escrituras da Mesa Mestral da Ordem de
Cristo na vila de Tomar.

Antes de dar lugar à publicação promovida pelo coordenador do CETARQUIVO, deixamos aqui uns pequenos reparos ao seu conteúdo para que o leitor perceba a sua importância.

As duas imagens conhecidas da Charola, anteriores ao século XVII, correspondem a iluminuras de dois livros quinhentistas. Uma das imagens, retirada dos designados livros "Leitura Nova" (Fig 1), dá-nos a conhecê-la pelas mãos de um anjo e talvez seja a mais difundida. A outra, menos divulgada, está reproduzida em alguma literatura, nomeadamente nos Anais da UAMOC, todavia, sempre a preto e branco e sem deixar perceber de que modo se insere no livro. Trata-se de uma iluminura de uma letra capitular e ao contrário do que se possa pensar, é bastante preenchida de cor. Estamos em crer ser a primeira vez que se publica esta imagem da Charola contextualizada no texto que a rodeia e colorida conforme está no original (Fig 2).

Fig 1                                  Fig 2

É necessário, antes de prosseguir, pedir algumas reservas quanto à sua representação: Trata-se somente de uma tentativa de reconstituição de como teria sido anteriormente a D. Manuel I e não como efectivamente era na altura, visto no decorrer dos séculos ter sofrido obras que alteraram o primitivo oratório da fortaleza. Já não possuía a porta que se vê na imagem, tendo dado lugar à janela que conhecemos actualmente e nem a cobertura era a mesma.

Se desenhada com base em memorias ou porventura em algum desenho entretanto desaparecido não há maneira de o sabermos, não deixando no entanto de ser um valioso documento histórico, nem que seja pela ideia que se tinha da mesma em tempos anteriores.

Outro aspecto de interesse especial, e que está ainda mal explorado, é o que concerne ao Tombo de Santa Maria dos Olivais. São diversas as alusões ao dito tombo e para o qual o autor contribuiu com um texto, não obstante os seus autores mais profícuos terem sido Gaspar Garro (de letra gorda e grossa), que o iniciou, e Bartolomeu de Almeida que o finalizou. Denota-se deste modo, a relação que existe entre os dois tombos no que diz respeito a informações pertinentes sobre os assuntos tratados em ambos.

Ainda sobre o mítico Tombo de Santa Maria e sobre o qual muito se tem especulado quanto aos segredos que encerra, aproveitamos o momento para dizer que existe a ideia de que se tenha perdido, preocupação manifestada pela UAMOC quando se refere ao mesmo dizendo que anda por ai aos tombos já naquela altura. Não está perdido e encontra-se em relativamente bom estado.

A titulo de curiosidade, podemos realçar que no Tombo de Santa Maria, de 236 fólios, pode-se recolher informações relacionadas com os túmulos destruídos “sem aver disso necessidade”, segundo a opinião do autor, e é precedido de um texto ao qual atribui a designação de “Vestíbulo” do livro (16 fólios), claramente num sentido metafórico, porque tal como nos vestíbulos “se acha qualquer notável e preciosa matéria de que no livro se trata…”. Visto não ser esta a matéria de agora avancemos adiante.

Após esta introdução estar concluída e o trabalho do Cetarquivo pronto a publicar, o Sérgio Tavares, manifestamente surpreso (não era para menos), informa-nos que existe um texto escondido e aparentemente imperceptível no primeiro fólio, e que possivelmente iria conseguir dá-lo a conhecer. Até ao presente momento ainda não obtivemos notícias do seu teor, mas a certeza, da parte do Sérgio Tavares, de que, seguramente, irá conseguir publicar quase a totalidade do que se esconde nessas letras que nos passaram despercebidas. Poderia ser simplesmente o decalque da página seguinte ou a tinta da página anterior mas já nos foi garantido não o ser. Ficamos então muito ansiosos por tal, e para não tardar esta publicação, iremos o incluir muito brevemente num post no seguimento deste.
Na parte final deste texto inclui-se algumas das espectaculares capitulares do Tombo, onde alias se pode verificar duas interessantes imagens, a nosso ver, de D. Manuel I e D. João III, e para as quais se pede a vossa maior atenção, com realce para a primeira capitular do lado esquerdo, por ventura a de D. Manuel.

Não sendo uma publicação critica da parte do Cetarquivo optámos por fazer um pequeno reparo numa publicação à parte, guardando para outro post uma análise mais exaustiva em conjunto com as descrições de Frei Jerónimo Roman.

Só nos resta assim congratular o Sérgio Tavares por esta iniciativa e ficamos aguardar mais algumas publicações relacionadas com este Tombo, visto ter-nos sido dito haver outras partes de interesse superior para os estudos que o Cethomar vem promovendo através do Blog.

                                                                                           Degraconis
                                                                                        P’lo Cethomar

1. Introdução

O CETARQUIVO, cujo âmbito é o de apoiar os diversos núcleos de trabalho do CET (o CETHOMAR por enquanto é o único ainda divulgado publicamente), vem por meio deste post dar a conhecer a primeira de várias publicações cujo objectivo é expôr parte do importante acervo documental que têm vindo a reunir ao longo dos últimos anos, sendo o objecto deste agora publicado de especial interesse para o CETHOMAR o qual agradeço, na pessoa do Degraconis, o apoio na sua elaboração.

No momento de entregar ao público o presente texto, cumpre-me mencionar que obra tão vasta e complicada não se afigurou obra fácil. Conhecedor das limitações em termos de recursos e habilitações em paleografia para semelhante tarefa, não espero como tal, ser isento de críticas, incluindo-me nas primeiras fileiras dos leitores que possam tecer ásperas críticas a este trabalho de actualização de um texto arcaico de caligrafia e pontuação bastante diferente do nosso português corrente, o qual deve obedecer a regras convencionadas por mim desconhecidas.

Humildemente, estimo no entanto, aparte do proveito que seja possível do trabalho realizado, que o leitor lhe traga correcções que lhe pareçam aproveitáveis para a dignidade que o texto merece. Caso já tenho sido feito semelhante trabalho, o qual não conheço, muito agradeço indicação do seu paradeiro.

Não pretendo tecer considerações sobre o seu conteúdo e autor, visto ser apenas uma publicação com o intuito de divulgar.

Convém no entanto informar os leitores, tratar-se de um Tombo encomendado por D. João III, administrador do Mestrado da Ordem de Cristo, ao Pedro Álvares (1492-1581), cavaleiro da Ordem, por Alvará dado em Tomar em 1542, conforme escrito no fólio inicial, aqui transcrito, não obstante a sua feitura ser bastante posterior.

Acompanha esta publicação um apêndice com algumas das belíssimas capitulares que surgem ao longo do texto. Este tema será aprofundado futuramente. O CETARQUIVO publicará em forma de catálogo a totalidade das capitulares que se encontram patentes neste tombo. Lembro que o pdf inclui notas minhas de rodapé ao texto que não foi possível colocar no blog. O pedido do pdf deverá ser efectuado por email.

                                                                           Sérgio Tavares
                                                                  Coordenador do Cetarquivo


2. Tombo dos Bens, Rendas, Direitos e ...


(carregar 2x para alta resolução e possível leitura)

"De El Rei faço saber a vós doutor Pedro Alvares do meu desembargo e juízo das causas do convento desta vila de Tomar que por meu regimento vos tenho mandado que fizésseis demarcação das heranças e propriedades do dito convento e igrejas desta vila e dos bens e heranças que pertencem à mesa mestral na dita vila e seu termo / e porque agora serão informado que a dita demarcação é feita vos mando que façais tombo de todas as ditas heranças e propriedades do dito convento e igrejas e da mesa mestral / os quais tombos fareis em livros encadernados apartados sobre e no principio de cada livro será trasladado este alvará para se saber como os ditos tombos se fizeram por meu mandado, e assim mesmo fareis tombo dos bens que pertencem à vigaria desta vila de Tomar e às comendas do convento pela dita maneira, e este alvará mando que se cumpra posto que não seja passado pela chancelaria sem embargo da ordenação em contrário, Jorge Rodrigo o fez em Tomar a seis de Maio de mil e quinhentos e quarenta e dois anos.
S
(na parte inferior da página descobri um texto apagado que consegui reconstituir
 em algumas das suas partes. Está públicado no post seguinte)

Da invocação da igreja do convento e do seu fundador. Folio 2


(Fólio onde se insere a imagem da Charola)

A igreja deste convento é da invocação do bem-aventurado São Tomás Arcebispo Cantuáriense (de Cantuária) do Reino de Inglaterra e ao fazer deste tombo não se achou nem pôde saber quem a edificou nem em que tempo/ pode ser que foi por negligência e descuido do Dom prior que era ao tempo que se mudou o portal principal dela que sabia estar da parte do levante entre a torre da capela de São Jorge e a dos sinos em cujo lugar agora está a fresta grande rasteira de vidraças por não guardar ou mandar trasladar o letreiro que devia estar sobre ela / como está o nome do edificador e tempo em que se edificou o castelo sobre o portal grande dos arcos debaixo da sala dos paços. E posto que ao presente não se saiba ao certo de quem a edificou nem em que tempo / pudesse crer por prováveis razões e conjecturas que o mesmo edificador do castelo que foi o mestre D. Gualdim a edificou / o que não pode ser senão depois de feito o castelo muitos anos / porque este castelo foi começado de edificar pelo dito mestre no primeiro dia de Março da era de mil e cento e sessenta e oito / que fora o ano do nascimento de nosso Senhor Jesus Cristo mil e cento e trinta, tirados os trinta e oito anos que a era de era de César precedeu o dito nascimento: ao qual tempo não era, nem dai a mais de trinta anos foi canonizado este bem-aventurado santo / a cuja honra e sob cuja invocação se fez esta igreja / porque o papá Alexandre terceiro que o canonizou foi eleito no ano do nascimento do senhor de mil e cento e cinquenta e oito e canonizou-o no sétimo ano de seu pontificado / e não se podia dedicar igreja à sua  honra e sob sua invocação senão depois de ser canonizado / pelo que está manifesto que depois de se começar de edificar o castelo se passaram trinta anos ou mais antes que se pudesse edificar esta igreja, e que o mesmo Dom Gualdim que edificou o castelo a edificasse parece porque era vivo ao tempo que se o dito santo canonizou e viveu depois vinte e nove anos porque faleceu na era de mil e duzentos e trinta e três segundo se mostra pelo epitáfio da sua sepultura que está em Santa Maria do Olival que foi no ano do nascimento do Nosso Senhor Jesus Cristo mil e cento e noventa e cinco / e é bem de crer que homem tão grande edificador que tantos castelos edificou quis dar fim e remate à sua inclinação de edificar juntamente com sua vida em fazer e acabar o mais nobre edifício de todos quantos fez assim por ser dedicado ao culto divino como por a obra ser muito melhor na forma e fortaleza que todas as outra que fez,

Primeira parte do tombo do convento.


Forma e fortaleza desta casa,
A capela desta igreja está em meio dela e é uma charola oitavada e em cada oitavo fica seu arco vão / e parece que se fez assim para o altar estar no meio dela e se poder ver Deus de todas as partes ao redor / e sobre cada arco está uma fresta para claridade do alto da capela e cada um dos oito pilares que estão entre arco e arco têm incorporadas quatro colunas / as duas que estão de frente uma da outra em cada arco não sobem mais que até à volta deles e as outras duas que estão uma da parte de dentro da capela e outra de fora sobem até as voltas das abóbadas da capela e do corpo / o corpo cerca a capela de redor e é de tanta largura sua circunferência quanta é a do diâmetro da capela / e fez-se o corpo com engenhosa e graciosa invenção em dezasseis vãos sendo a capela em oitavos / e a cada um dos oitavos da capela respondem dos dezasseis do dito corpo / cada um dos quais e tamanho como cada um dos oitavos nem mais nem menos / e em cada canto destes dezasseis vãos está meio pilar com sua coluna incorporada do modo e forma dos da capela e sobe até à volta da abóbada e de cada coluna nasce seu arco sobre que se firma a abóbada: dos quais oito respondem às outras oito colunas da capela / os outros oito acabam em represas sobre as frestas da mesma capela / e nos panos de entre pilar e pilar do corpo estão oito frechas em sua proporção e altura / um dos panos com fresta e outro sem ela e algumas destas frestas do corpo estão agora tapadas por causa das obras que depois se fizeram / as paredes são de onze palmos em grosso / afortelezadas com 16 fortes botareos da parte de fora em que estribão os dezasseis arcos da abobada. Foi feita esta igreja sem coro e só com dois portais / dos quais o mais pequeno fica dentro do cerco que vêm do castelo a esta igreja e à mão direita da entrada deste portal vai pelo grosso da parede uma escada para o andar de cima da abobada / o outro portal era o principal e estava contra o levante para fora do dito cerco entre a torre de São Jorge e a dos sinos onde agora está a frecha de vidraças rasteira de que fica dito / e desta maneira e forma deixou o edificador esta casa e formoso e muito gracioso templo / esperando pelos prósperos e claros tempos D’El Rei D. Manuel da gloriosa memória que os tem / e D´El Rei D. João nosso senhor seu filho para o adornar como fizeram espiritual e temporalmente com tão religioso e devoto culto divino e tão sumptuosas e tais obras que assim aos naturais como aos estrangeiros que as vêem alevantam os espíritos à contemplação dos bens da glória divina.

Para que foi edificada a igreja do convento. Fólio 3


Que esta igreja não foi edificada para ser mosteiro e convento de religiosos como agora é senão para oratório privado e fortaleza.
Manifesto está que esta igreja não foi edificada para ser convento dos religiosos do Templo que o castelo e cerca desta vila e edificaram e povoaram de começo / porque tinham nela seu convento que era a igreja de Santa Maria do Olival como tenho dito no tombo dela / mas as causas e fim porque se podiam mover o dito mestre D. Gualdim e religiosos a edificá-la / deviam ser para os que estivessem em guarda deste castelo / em tempo que disso houvesse necessidade tivessem oratório em que ouvissem missa e orassem e juntamente fortaleza / a qual no lugar onde esta igreja está edificada lhe era necessária por ser muito mais alto que o lugar onde está o castelo que lhe fica sujeito / em tanto / que tomado este lugar / com pouca dificuldade se tomaria o castelo / e pode ser e assim parece que nesta necessidade de terem fortaleza neste lugar se viram o mestre D. Gualdim e seus cavaleiros no ano do nascimento de nosso Senhor Jesus Cristo mil e cento e noventa / no qual tempo os mouros os tiveram cercados por seis dias neste castelo como se mostra pela segunda parte do letreiro que está sobre a porta dos arcos debaixo da sala dos paços e por mim dito no tombo de Santa Maria do Olival e daquele tempo parece muito conforme a verdade que se o dito mestre Dom Gualdim foi o edificador desta casa (como é de crer) a começou de edificar e teve tempo para a acabar antes do seu falecimento / porque viveu depois cinco anos como se mostra pelo epitáfio de sua sepultura já atrás dito. E a dedicá-la à honra e sob nome e invocação deste santo o moveriam à santidade de sua vida e os milagres que o Senhor Deus por ele fez depois de sua morte cuja a fama por toda cristandade resplandecia em vida do dito mestre …

1 comentário:

CLUNY disse...

Cara Berta obrigado pelas suas palavras, foram importantes e motivadoras

Se quiser debater alguma duvida que tenha da transcrição esteja a vontade.

É muito importante que se fale para que possamos de ir de encontro aquilo que as pessoas gostam de ler e para que surjam debates com ideias diferentes.

Quando o CETARQUIVO se propôs a divulgar este tombo foi necessário seleccionar partes de um conjunto de 428 páginas que servissem dois objectivos:

1. Dar a conhecer um dos cerca 1000e tal livros (todos em pdf) que fazem parte do acervo CETARQUIVO, dai o termo divulgação.

2. Transcrever o texto para o português actual, de forma que se possa entender, sem que fosse feita uma análise crítica.

Foi então decidido que seriam estas páginas que iríamos então transcrever para a primeira publicação (outras se seguirão).

O processo desenrola-se de inicio com alguma dificuldade.

Estávamos perante uma escrita em que se assiste a uma economia não digo de palavras mas de letras, encontra-se palavras escritas de forma diferente e uma pontuação totalmente diferente da nossa escrita.

Com o decorrer do trabalho as dificuldades iniciais são ultrapassadas, vamo-nos adaptando.

Acabando mesmo, em outros trabalhos eu chegar a escrever palavras neste português antigo sem que de tal me aperceba.

O CETARQUIVO tem no seu acervo alguns livros paleografia entre os quais o "Abreviaturas Paleográficas Portuguesas de E. Borges Nunes de 1981" e "Paleografia Portuguesa Básica de 1978" que vêm de algum modo ajudar na transcrição.

Este processo demora cerca de três semanas, várias revisões de texto são realizadas até chegarmos a este trabalho.